domingo, 15 de março de 2009

Murilo Salles, Erick Rocha, Arthur Omar e Tunga: parcerias em vídeos

ReGreciar de Tunga

*Segundo o artista Tunga, numa entrevista a José Jiménez, do Instituto Cervantes, em março de 2005, Pirar traz a inspiração e a aspiração. Pois a piração lhe conduz as musas: reGreciar, voltar a Grécia.
O termo pirar é uma síntese dialética entre inspirar e aspirar.

*A tradição dos gregos, desde Platão, tirando a loucura como enfermidade, existe a loucura divina, no que se refere ao namorado, daí surge a expressão: louco de amor. Possuídos por esta loucura é o poeta, que nos leva diretamente as musas e a Apolo.

*Toda discussão sobre arte, que remete ao lugar do início do século passado, busca de algum modo a independência da idéia a respeito da técnica. A poesia se exerce em todos os lugares, é a liberdade. Por si mesma, a poesia é constituída no moderno com Baudelaire em situações impensáveis, nos usos habituais da linguagem.
Tunga fala do ponto de vista da poesia. Se perguntar a Tunga se ele é um artista, ele te responderá que não, ele te dirá, "sou poeta".

*Num dos vídeos aparecem 3 moças nuas, nas quais, nos remete a imagem das 3 graças, o que seria, entre tantos outros, um indício dessa espécie de caminho de volta a poesia central no trabalho.

*Humanos são poetas por que a vocação do homem é a poesia. Somos o poema que queremos ser e isso se manifesta em palavras, por gestos, por obras, pelo silêncio. A presença ideal do mundo em forma de poesia, através de linguagens e de poemas, que estão em consonância com sua própria existência e cantam o amor e a morte, diz o artista na entrevista.

*O trabalho do artista Tunga, no que se refere as performances, não se trata de comunicar, compartilhar, expressar ou dividir informação, mas sim, aponta em direção de uma experiência de caráter único que a experiência é. A poesia projetada, assimilada por um, não é a mesma para outro, a leitura de sua vivência com o mundo. Temporalidade diversa.

Priscilla Duarte

Bibliografia:

*Jiménez, José- Lãs películas, los vídeos. Entrevista a Tunga de José Jiménez. Instituto Cervantes.
*Brito, Ronaldo- Experiência Flutuante- in: Tunga. Espaço ABC, 1980- Catálogo
*Duarte, Paulo Sérgio- De olho nas pálpebras- in: Paulo Sárgio Duarte: A trilha da trama e outros textos sobre arte. Org. Luisa Duarte. Funatrte 2004


Videografia:


*Tunga: Películas
- o nervo de prata ( em parceria com Arthur Omar)
-egypsia and the phenyx (vídeo performance)
-quimera ( dirigido po Erick Rocha)

-Medula ( dirigido por Erick Rocha)

*Tunga: “És tu, Brasil”
Direção: Murilo Salles

*Tunga: lês affinités, életives (vídeo performance)

“A Estética Marginal”

Malditos em Movimento

Segundo Fernão Ramos, a estética Marginal se caracteriza através de 3 elementos estruturais, centrais, que dão coesão ao nível estético e que levaram este estilo, também conhecido por Udigrudi, Underground, Subterrâneo, Tupiniquim, etc, a ser um “movimento” dentro do cinema brasileiro: 1) a agressão; 2) a estilização; 3) a fragmentação narrativa.
Financiados pela extinta Embrafilme, que já andava mal das pernas até o Collor acabar de vez com ela no início da década de 80, os cineastas “malditos” produziam seus filmes em resposta ao ano de 64, marcado por conturbado período de repressão político militar. Portanto, muitos filmes eram censurados antes mesmo de irem para as salas de exibição.

1) Procedimentos de Agressão: o horror e a imagem abjeta.

O item nº 1, a agressão, é marcada pelo horror e a imagem abjeta, no qual, a imagem abjeta possui 5 características que a definem:
* deglutição aversiva
* representação de humanos como animais
* baba de sangue
* o vômito
* defecação

Estas imagens chamadas de abjetas tornam-se significativas quando as cenas se alongam com muita intensidade dramática.
É o universo das baixarias que constitui a narrativa Marginal. A imagem abjeta se faz no corpo, o próprio ser é o mal estar, as cenas de sofrimento corporal nos remetam ao clima político, de torturas, época dos anos e chumbo.
A representação do horror está relacionada às torturas praticadas por militares neste momento de ditadura no Brasil. Característico do horror é, também, o berro, a irritação, a dor, o incômodo, a nojeira, todo o universo baixo.
Irritar espectador é um objetivo dos cineastas malditos. Conseguir incomodar, a ponto de fazer as pessoas saírem do cinema, é o ponto auge o qual se quer chegar. A função é chocar, acordar as massas, a burguesia, um compromisso sócio-político e cultural.
Agressão é, também, a fragmentação da intriga, porque colide com a fruição do desenvolvimento linear da narrativa, ao qual, está acostumado o espectador. A atitude de deboche histérico-agressivo, o personagem chato que avacalha, afronta o senso estético, quebra a cena, perturba.
A linguagem subversiva confronta o objeto do belo, uma postura frente às posições da indústria cinematográfica, opondo-se a circulação da mercadoria audiovisual no contexto da sociedade capitalista.

2) Procedimentos de Estilização: a construção do universo ficcional.

No Cinema Marginal, além do horror e da imagem abjeta existe uma posição lúdica. Os procedimentos de estilização são diversos, as atitudes dos personagens são extremamente exageradas, deformadas e caricatas.
A representação em seu limite da origem a estilos marcantes e característicos como a bicha, a madame, o machão, a prostituta, o burguês, que são personagens típicos, de atitudes excessivas, movimentos rebuscados, figurino cafona, ditos populares e muitas vezes em rima.
O aspecto lúdico, ligado ao avacalho, é marcado pela curtição e abjeção. A abjeção é o nojo, o asno, a imundice, a porcaria e a degradação, e a curtição são as atitudes irreverentes, carnavalescas. O avacalho, curtição e agressão, nos quais, o objeto é o próprio fazer do cinema, a narrativa mal elaborada, mal fotografada, mal montada. E a agressão são perspectivas de fruição da representação do deboche-histérico do horror, já citado antes.
A deglutição curtidora é uma atitude antropofágica voltada para os estilos das narrativas clássicas, principalmente o cinema americano. O que se excreta é o avacalho. O devorar é feito sob forma de citações, acentuando os traços mais marcantes da forma original.
A atração pela estilização do gênero é apresentada por forte influência das histórias em quadrinho.
As citações ou incorporações de reproduções de trechos da narrativa clássica, especialmente o filme noir, de forma estilizada, vêm de originais marcados por gêneros.
A presença do Kitsch e do cafona é associada a estas citações estilísticas, abandonando padrões de beleza que confrontam conceitos da forma do belo, do produto artístico elabora pela indústria cultual.

3) A Fragmentação Narrativa.

A fragmentação narrativa seria o contrário do que seria evolução da narrativa clássica. A fragmentação das diferentes estórias que compõem o enredo do filme. Um questionamento a representação clássica.
Jean-Claude Bernadet já tinha analisado esta forma de narrativa no livro, “Trajetória Crítica”, com o filme “Rio 40°”, de Nelson Pereira dos Santos, tido com um dos pioneiros do Cinema Novo. Essa afronta caminhou em direção aos anos 60 e 70 para o Cinema Marginal, onde se reconhece a influência do Cinema Novo no Cinema Marginal.
No Cinema Novo existia a necessidade de representar o universo social brasileiro. No Cinema Margnal, a narrativa mergulha no universo ficcional fantasista.
A intenção do Cinema Marginal não era de contar uma ação elaborada em história, sua função estava mais ligada a descrição, ou seja, mostrar uma situação dada.
O alongamento dos planos, a economia geral do texto fílmico, a câmera explorando o personagem, o olhar fixo ao representado. A câmera se fixava na imagem enquanto elemento plástico, diz Fernão Ramos.
O plasticismo da imagem é uma posição em relação ao movimento que conduz a ação, ao personagem, a intriga, sacrificando o desenvolvimento linear. Não há preocupação espacial ou temporal, há a verticalização da imagem.

*Conclusão
O Cinema Marginal aponta para o estado de espírito de uma geração que decidiu fazer cinema. Propôs o choque, a ruptura perante a presença aterrorizante do inimigo prepotente e autoritário que ameaçava a integridade física e intelectual.

Priscilla Duarte

Estratégias Políticas para a “Retomada” do Cinema Brasileiro

Depois do desmonte da Embrafilme no governo Collor, que provocou imenso prejuízo no cinema nacional nos anos 80, a Lei do Audiovisual, nos anos 90, com governo Fernando Henrique, foi uma grande estratégia política.
A Lei do Audiovisual foi apresentada pela primeira vez à produtores e cineastas no Festival de Brasília em 1992. O artigo 1º e o 3º, o primeiro que é a captação de recursos incentivados da venda de certificados representativos de percentual da receita do filme, e o terceiro que transformava em optativa a aplicação das empresas estrangeiras em filmes brasileiros através de abates no IR lá de fora o que fosse investido aqui.
Foram apontadas muitas contradições nestas leis, houve mudanças de lá pra cá.
Houve aumento no sentido de arrecadações que se deve a inúmeros fatores, como a elevação no abatimento no IR das empresas de 1% para 3%. Carlota Joaquina- Princesa do Brasil de Carla Camurati teve um público de mais de 1.2 milhões de espectadores.
Através da divulgação do primeiro edital do Prêmio Resgate do Cinema Brasileiro, criado pela Secretaria para o Desenvolvimento Audiovisual do Ministério da Cultura em 1993, com dinheiro transferido da Embrafilme para o Tesouro da União e conseguida através de taxação de filmes estrangeiros, que a Lei do Audiovisual cumprira realmente a sua função.
O Prêmio Resgate do Cinema Brasileiro teve 3 editais: dois de produção e um de finalização, que contemplava filmes paralisados com o fim da Embra.
Em São Paulo foi o Banespa, Banco do Estado de São Paulo, que criou o Programa de Apoio à Indústria Cinematográfica em 1993. Lamarca, de Sérgio Rezende, foi um dos contemplados deste programa.
A grande enfermidade do “cinema da retomada” é que, pela Lei, os investidores tornam-se sócios do filme, e simplesmente a grande maioria dos patrocinadores vigia os roteiros dos filmes, impõe cortes, provocando uma espécie de “censura” frente aos autores e diretores.
Segundo Sylvio Back, “é uma situação dramática depender de empresários, de diretores de marketing, de publicitários, para conseguir aprovar uma ‘obra de arte’”.
O empresário só participará de projetos de acordo com seus interesses.
Em 200, a classe cinematográfica se reuniu no 3º Congresso Brasileiro de Cinema, o CBC, e elaborou um relatório com 60 reivindicações, que foram encaminhadas ao Minc.Daí surgiu o Gedic, Grupo Executivo para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica, no Fórum de Competitividades, organizado pelo Ministério do Desenvolvimento da Indústria e do Comércio, ainda em 2000. Todo o esforço da Secretaria para o Desenvolvimento do Audiovisual não fora o suficiente.
Foi o Gedic que propôs a criação da Ancine, Agência Nacional do Cinema. Devido aos milhões que a indústria cinematográfica estava movimentando houve a necessidade de um órgão regulador e fiscalizador.

A Estética e a Cosmética
Os anos que seguiram a “retomada”, percebe-se a apreensão do “Brasil real”. Segundo Lùcia Nagib, o ‘renascimento’ do cinema, para muitos cineastas deste período, significou a ‘redescoberta’ da pátria. Central do Brasil, de Walter Salles, mostrou o contrário desta estética. A estética da retomada, que não é um movimento, é adepto da narrativa, com exceção de Júlio Bressane, de tradição experimentalista e indiferente ao mercado.
Para Ivana Bentes, a ‘estética da fome’ do Cinema Novo se transformou em ‘cosmética da fome’, a paixão pelo Brasil andava de mãos dadas com o aumento de produção de filmes. A comparação com o Cinema Novo, devido a preocupação com uma identidade nacional, era quase que inevitável.
Segundo Jean-Claude Bernadet, “a ponte que se faz entre o Cinema Novo e o de 1994 para cá, é absolutamente equivocada”, alegando que o cinema dos anos 60 havia “uma ligação e uma preocupação com uma proposta política que era fundamental para a sobrevivência ideológica do movimento”. Porém, segundo Bernadet, nota-se uma “grande nostalgia e até um certo fetichismo em relação ao Cinema Novo, que funciona como uma espécie de chancela de qualidade intelectual e artística”.
As maiores bilheterias do “Cinema da Retomada” foram “Xuxa Popstar”; “Auto da Compadecida”; “Xuxa Requebra”; “Simão, o Fantasma Trapalhão”; “Central do Brasil”; “O Noviço Rebelde”; “Carlota Joaquina”; “O Quatrilho”, etc. A filme B publicou em fevereiro de 2001, 30 filmes de bilheteria considerável.

Priscilla Duarte