domingo, 3 de julho de 2011

Tempo e memória :Do cinema artesanal de Andrei Tarkovski a narrativa cotidiana de Anton Tchekhov.

Tempo e memória :Do cinema artesanal de Andrei Tarkovski a narrativa cotidiana de Anton Tchekhov.



Por Jonas Arrabal

O Espelho foi o primeiro filme de Tarkovski que assisti. O seu filme mais pessoal , totalmente fragmentado, misturando lembranças da infância do diretor e poesias escritas e lidas pelo seu pai, Arseni Tarkovski. A Chegada até o cineasta se deu num momento de crise, mais especificamente no mesmo momento de crise do drama burguês, num momento de leitura da tríade moderna: Ibsen, Strindberg e Tchekhov. Dessas leituras começaram a surgir ligações com as idéias que Tarkovski apresentava em seus filmes, mais especificamente com a obra do dramaturgo – também russo – Anton Tchekhov.
Lendo Tchekhov e assistindo Tarkovski a minha primeira afirmação foi que o segundo filma aquilo que o primeiro narra, que as imagens de Tarkovski são as lembranças de Irina, de Macha, de Olga, de Nina, e de todos os outros personagens tchekhovianos. O cotidiano presente na narrativa do dramaturgo também pode ser visto nos filmes do diretor. Cotidiano esse que no cinema encontra uma grande problemática, que implica no processo narrativo da obra filmada, uma vez que a narrativa no cinema pela qual o público se acostumou é aquela onde as coisas acontecem com uma rapidez muito grande, em segundos a história ganha novos contornos. No cinema de Tarkovski o que fica bastante perceptivel é que o tempo que o cineasta filma, a cena, poderia ser um acontecimento real, o cotidiano.
O cotidiano da vida dos personagens em Tcheckov é muitro semelhante a esse cotidiano filmado pelo cineasta. Cotidiano que está recheado de indagações e de questões contemporâneas, como a incomunicabilidade e a estagnação. Em Tchekhov o que está muito presente é essa estagnação, são as irmãs que querem voltar para Moscou e sempre relembram da cidade com nostalgia, como se a distancia impede de retornar a cidade, mas que esse dia logo chegará, mas enquanto não chega, elas ali permacem, e ali recordam, e ali estão estagnadas.
Problematizar esse nada em Tarkovski vem com uma fúria em afirmar que esse nada é tudo na obra no cineasta russo. Que a narrativa dramática de Tarkovski é um recorte da vida, como no teatro de Tchekhov que não é necessário peripécias para compreender que ali está cheio de questões relativas a vida. Ao se deparar com Tarkovski a impressão que fica é que nada acontece, uma vez que as intrigas são sutis. Em Stalker e Nostalgia, para o receptor acostumado com golpes de teatro atrás do outro, tem a impressão de que nada acontece.O Nada é uma questão niilista de ver o mundo e a inquietação de Tarkovski é tão grande que seus personagens lutam com as suas próprias limitações, podendo ter até uma diferença com os personagens de Tchehkov, que estão imobilizados.
Anton e Andrei foram dois nomes que se aproximaram enquanto eu lia as teorias de Szondi, o presente que é pretexto para a evocação do passado, que é a problematização em Tchekhov para o agravamento da crise do drama, segundo o teórico em seu Teoria do drama Moderno. Aponto essa afirmação como ponto central na obra de Tarkovski. O passado que surge nas discussões do presente, como em Stalker,onde os personagens relembram o mundo que não existe mais, e entram na zona proibida a fim de encontrar respostar que explique o porque desse isolamento total.
O recurso do flashback não é característico do drama absoluto, porém no cinema essa recordação do passado é muito utilizada para se contar uma história. Nos dois artistas há uma problematização. Em Tchekchov que já sinaliza a crise do drama com toda essa narrativização que foge do tempo presente, que precisa voltar ao passado para explicar toda a sua condição atual e em Tarkovski que a narrativa foge da estrutura cinematográfica, priorizando o cotidiano do personagem, aquilo que poderia ser chamado de vida real.

Existe cinema independente no Brasil?

Existe cinema independente no Brasil?

Por Marcelo Ikeda



Afinal, existe cinema independente no Brasil? Mas para começar, o que vem a ser cinema independente? Para alguns, cinema independente seria um cinema avesso ao modo de produção dos grandes estúdios. Nesse caso, todo o cinema brasileiro seria independente, porque parte de um projeto de cinema periférico. Ou, em outras palavras, todo o cinema que não seja hollywoodiano seria independente.
Mas o que significaria o "independente"? Independência poderia se relacionar tanto a um conceito econômico quanto cultural. No caso econômico, seria um cinema que conseguiria prover os meios para se sustentar mesmo sem a megaestrutura dos estúdios. Isto é, com orçamentos reduzidos, equipes mínimas, produção ágil, e atendendo a um público específico, com um interesse especial em projetos que fujam do protótipo do cinemão. Nesse caso, praticamente nenhum cinema brasileiro é independente. Porque, como sabemos, quase todo filme brasileiro para existir precisa de apoio governamental, já que sua bilheteria (por uma série de motivos) não paga nem 1% de seus custos.
O lado mais complexo da questão no entanto é o conceito cultural. Um filme independente, nesse caso, seria um filme que abordasse valores, costumes, hábitos que não são abordados pelo cinemão. Enquanto o cinemão pensa exclusivamente nas leis de mercado, como um puro negócio cujo objetivo principal é a geração de lucros, o cinema independente pode exercitar linguagem, questionar a sociedade, as estruturas de poder, propor uma espécie de ensaio audiovisual, ser um cinema político, enfim, não ser primordialmente um produto a ser consumido. No entanto, muitas vezes se torna difícil definir se o filme é ou não independente tendo em vista este quesito.
O verdadeiro cinema independente, portanto, deve unir esses três pontos: i) não vir de Hollywood, ii) ser financeiramente auto-sustentável e iii) não deve visar em primeiro lugar o lucro, mas sim um aspecto cultural. Desse ponto pergunto: qual é o cinema independente no Brasil? O próximo filme da Xuxa é independente? Sim, se pensarmos no primeiro critério, e talvez, se pensarmos no segundo. Estorvo, de Ruy Guerra, ou o próximo filme de Júlio Bressane, são independentes? Sim se pensarmos no primeiro e terceiro itens, mas não se pensarmos no segundo.
No entanto, são tipos completamente diferentes de independência, e isso deve ser repensado nas políticas de apoio governamental. A intervenção do Estado se justificaria para corrigir as ditas "falhas de mercado", isto é, numa tentativa de corrigir ou equiparar nítidas discrepâncias. Por um lado, é claro que um filme brasileiro como Xuxa Requebra tem uma dificuldade natural para competir com um blockbuster americano como Jurassic Park, mas ambos têm o mesmo objetivo: o mercado. Mas se é difícil para a Xuxa, o que será para Ruy Guerra? Dessa forma, parece injusto que tanto o filme da Xuxa quanto o dito "filme de arte" tenham os mesmos privilégios e benefícios das leis de incentivo.
Mas, por outro lado, existe um tipo de filme que ainda é menos independente que o filme da Xuxa, por mais incrível que isto a princípio possa parecer. Vejamos, por exemplo, o caso de filmes como Tolerância, A Hora Marcada, ou mesmo Guerra de Canudos. São filmes que só podem ser chamados de independentes se considerarmos o primeiro critério. São filmes caros, lentos, com cuidadoso processo de produção, e que visam essencialmente o mercado (No caso de um filme como Guerra de Canudos, ainda pode-se usar como desculpa a parte histórica como conceito cultural, mas isso é enganoso, já que o filme não se propõe a nenhuma reflexão crítica sobre o momento histórico, em contraste com Os Inconfidentes, de Joaquim Pedro, por exemplo). Como é possível então defender o apoio estatal a este tipo de filme?
É preciso observar, então, que existe uma boa parcela de filmes brasileiros que fazem pose de independentes, mas no fundo é apenas pose. São no fundo puro cinemão feito no Brasil. É possível argumentar que, se houvesse um maior número de salas de cinema, maior poder aquisitivo do consumidor, uma política cinematográfica mais ativa, etcetera, etcetera, esses filmes, no médio e longo prazo, poderiam ser rentáveis. Mas é um pensamento ainda muito distante da nossa realidade. No fundo no fundo, esses filmes só não são cinemão por pura incompetência de seus realizadores, que adorariam ter sua marca de enlatados "made in USA".
Marcelo Ikeda, formado em economia pela UFRJ, é aluno do curso de cinema da UFF desde 1998, sendo monitor da disciplina História do Cinema Mundial. Editor do site Claquete (http://w3.to/ikeda), com críticas e ensaios sobre cinema. Seu primeiro vídeo, 'Depois da Noite' (1999), explorando o tema da incomunicabilidade de uma criança, recebeu a Menção Honrosa no Festival Vide Vídeo/UFRJ em 1999.
Contato pelo e-mail: claquete@hotmail.com.

Guy Debord: Muito além do cinema

Guy Debord:
Muito além do cinema
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Por Luiz Rosemberg Filho e Sindoval Aguiar, do Rio de Janeiro

Alucinados pela tirania das imagens, submissos à tirania da mídia, viramos uma multidão desinformada, submissa e aquartelada.

Guy Debord
“Burocracia/ Prisão econômica/ E campo de provas/ Da burguesia/ Onde se tritura o sujeito/ E depois rumina/ Como certeza da ruína/ E cansada de tantas vitórias/ Apenas espera/ Uma nova fase do capitalismo/ Além dessa do triturar/ Pelo olhar/ Que a sociedade do espetáculo/ Esmera de passagem/ Pela abundância da imagem/ E sem a necessidade/ Do ruminar.”
Sindoval Aguiar em “Tantas Vitórias”


Queiramos ou não, o espetáculo pelo espetáculo, muito comum nos dias de hoje, é a concretização de fascismos. O eterno ex-defunto volta a enquadrar-se na retórica de implicações perigosas, como a burocracia. Ora, o que são as imagens-flashes da política, das religiões na TV, das guerras, da publicidade e mesmo do fardo das novelas? São, sim, artifícios simbólicos de dominação pela via do espetáculo. O ressuscitar da besta fertilizando “novos” horrores. Do velho conservadorismo dos discursos que nada dizem a um naturalismo eternizador como proposta de poder. Poder ser para a morte do saber. Ora, por que não se ressalta nunca o caráter repressivo do espetáculo? Qual a trajetória da sua onipotência ligada à religião, ao cinema e à TV? Espaços onde todos são vendidos como “artistas”, nessa feia região do nada. E no baixo jogo das dissimulações, o fingimento como máscara de uma sinceridade duvidosa.

Nunca, em tempo algum, se usou tanto o espaço dos crimes como ilustração “positiva” repressiva do horror. O bufão apatetado e carola na TV grita ter Deus no coração. Nada mais dissimulativo no baixo uso do fascismo como arma de intimidação, pois o ser humano virou objeto de uso descartável que, ao viver entre injustiças e autoridades, não passa de um fantoche sem expressão humana alguma. Só serve para produzir, consumir, vomitar e votar no cinismo político do nosso tempo. Estamos todos impregnados da presença da miséria-espetáculo como forma de diluição permanente. O político, o religioso, o comunicador e o burocrata são as “razões” teóricas, através das quais funciona a propagação de fascismos partidários. Ontem o nazi-fascismo. Hoje a televisão e seus anunciantes que nos fazem comprar seja lá o que for, desde que seja lixo!

O espetáculo da produção só quer contemplação, e não um mínimo de transformação. Temem o enfraquecimento da hipocrisia como arte empobrecida. Daí esse culto exasperante ao “vilão bem-intencionado” da política à religião na TV. Usa-se o espectador idiotizado para aceitação do que seja, e trabalhado 24 horas para não pensar, produzir, consumir e se sentir “feliz” por um falso discurso produzido e fechado na melancolia de um imenso vazio. Vazio, enfim, que responde pela sua mudez. Cabe ao “ator” do espetáculo mentir mais e satisfazer-se com sua morte agonizante, mas que justificará seu sucesso e sua vaidade de idiota, identificado-o com a missa grossa do capital.

O defunto pensa que sabe o que está fazendo, e seu desafio é não ser demasiadamente o que é: um idiota a serviço do fascismo como espetáculo. A máquina sabe bem como usar a todos, imputando-nos esquecimentos, obrigações, silêncios e perversidades. “Pensando” sempre em voz alta, diz: -Crucificai-o pois já está morto e não sabe! O catequista-religioso sente-se vitorioso. A atriz-tecnicollor-digital se realiza em sua marcha para o sucesso a qualquer preço. O político, ainda na era colonial, não se importa de se embrenhar na corrupção e se sentir um Deus socializador do óbvio. Inofensivos, os roteiristas das novelas ou do cinemão aplaudem por se sentirem vivendo no apogeu da eterna glorificação de Hollywood.


A Confederação dos Burocratas do Brasil acompanha esse afã com uma dissertação pomposa em defesa do dinheiro público para nossas múmias tropicais. É preciso valorizar nosso surto capitalista de nos devorarmos vivos, na nossa Wall Street de Pindamonhangaba: todas as repartições públicas que lidam com a Cultura! Sempre evasivo, o Bonequinho aplaude e fica de quatro. Mas é o que o professorado infantil de “Malhação” entende como responsabilidade dos novos fantoches descolloridos: uma especialização comum do óbvio, sem improvisação alguma. E, por extensão, para os novos alunos virarem cartões-bostais, extasiando-se com as reminiscências da Casa Grande. O pictórico do espetáculo jorra da cacetada da sua reestreia na próxima novelinha das 7. Do lixo para o lixo, sempre no lixo oficial!

Ora, como pode a televisão aberta e privada ser uma espécie de monopólio da comunicação? E já agora transformando o cinema no novelão das 9! Claro que as forças obscuras do passado estão lá dentro inventando que glorificam o cinema. Mas que tipo de cinema? No seu teatrinho de marionetes intensificam o espírito-yankee burocrático empresarial que aprenderam com a ditadura, na administração infindável de seus muitos horrores. Como já estão velhos (talvez mortos!), volta e meia os encontramos rotos internamente em hospitais, enterros e cemitérios. Mas alguns ainda gostam de ouvir que foram, no passado... cineastas! “Cada qual com o seu quadrado” na valorização de mão-única do sucesso do patrão. Ontem a ditadura. Hoje a TV. Realizam-se como porta-vozes alfabetizados pelo idiotismo televisivo à disposição do espetáculo.

São os Xuxos da “nova” era da obviedade, sedimentados no eterno poder de mandar e humilhar. Único compromisso imposto na ditadura e na TV, tenazes na sua projeção simbólica do passo-de-ganso que o regime militar desenvolveu como técnica dos discursos religiosos, e no virtuosismo da burocracia, ao servir às multinacionais da informação, e no que eles entendem como cinema. Ora, raros são os filmes como O Leopardo, Dr. Fantástico, Fanny e Alexander, Blow-Up e Macunaíma, que subvertem o sentido bélico e alienante do espetáculo em seu desenvolvimento crítico.

Hollywood criou um modelo burro e autoritário para o mundo, impondo forças produtivas reacionárias capazes de legitimar hierarquias, copistas, hegemonias, privilégios, esquizofrenia, imobilismos, burocracias e fascismos. Sob sua jurisdição, o que importa é enraizarem-se como movimento “civilizatório” potencializado pelo capital. Basta que se vejam no mundo os “filmes” que alardeiam grandes sucessos de bilheteria: inconsequentes numa velada (ou não), reconsolidação de fascismos como um princípio fundamental repressivo. O grande público é tratado para só ser pagante e alienado à luz do espetáculo conservador. Mas... é onde a “sociedade burocrática de consumo” vai gozar: numa rejeição mesquinha ao saber e a uma politização criativa e poética da arte cinematográfica.

Chegamos, então, ao delicado cinema de Guy Debord. Seus filmes se definem como uma tese central, a da abdicação da verdade, que forma o espetáculo que a sociedade assumiu e quer nos impor. Ou melhor, nos impõe como realidade. E da qual não conseguimos escapar porque ela está presente em nossas vidas como um criminoso à nossa espera, em emboscada. Mas Debord, em seus filmes, tem sua estratégia sóbria, delicada e contundente, a do saber como terrorismo cultural, e cujo torpedo ele carrega em suas ideias – incapazes de serem interceptadas por qualquer escudo antimíssil. E que, quando lançado, não destrói, instrui. Desdobra e desconstrói, compõe e recompõe através de fragmentos do real que ele parafraseia, pausada e musicalmente, tornando o campo de batalhas um local de encontro, substituindo o monólogo da morte pelo diálogo com a vida. Esta coisa única, nossa e insubstituível. A linguagem extra-imagem de Debord nos aproxima ainda mais de Godard. Consciência sem ambivalências!

Assim são os filmes de Debord, um encontro inesperado entre duas forças antagônicas, não ambivalentes, mas possíveis de uma aproximação porque da realidade ninguém escapa. O que Debord sabia e de que não fugia! Porque, para ele, a realidade já era a modernidade com suas inúmeras contradições, tendo, ao centro, a comandá-la, o terror do capitalismo e do controle dos meios de produção, superada aquela fase de indecisão da década de 60 em que guerras eram ativadas como superação de suas crises e manutenção de sua eterna e constante produção de lucros e mortes.

Do outro lado, para o encontro, estava esse fantástico e impressionante cinema de Debord. O de um experimento muito além do cinema, porque o que ele incorpora é justamente a análise da imagem pela decomposição em incomparáveis tentativas de diálogo com elas (que só sabem monologar pela concepção impositiva de que são formadas). E, aos poucos, pela beleza do encontro, as imagens acabam aceitando a abdicação de suas verdades. Com a relação entre imagens e linguagens se definindo pela abstração daquelas e a supremacia e a presença de uma exposição lúcida e convincente da linguagem sobre o que aquelas imagens estavam representando. Ali onde o espetáculo que elas significavam era a forma mais perversa de nossa fragmentação e separação de nós mesmos. Porque tudo o que não temos e, nem está em nós, está presente na forma de espetáculo.

Como uma novela, por exemplo. Tudo está lá: luxo, lixo, traição, riqueza, violência, sonhos, contradições, menos o ser humano! E somos tragados, sugados e trucidados. E a tudo isso vamos nos acostumando como divertimento, controle e submissão psicológica de base política em todos os níveis: econômicos, religiosos e culturais. Imagens que nos são impostas a partir de necessidades que temos delas como oferenda e culto. O mais cruel é que a própria sociedade não vive mais sem as necessidades dessas imagens. Produzidas e administradas em rede, onde todos temos que cair. E onde Debord se recusa a ser peixe frito!

Enquanto as imagens monologam, Debord impõe o diálogo com a serenidade e a desconstrução do próprio confronto. Oferece também tudo aquilo que o marxismo nos apresenta para mudar o mundo, além da filosofia, a luta de classes, a universalização do conhecimento e das coisas mais íntimas de nosso dia a dia – a realidade – coisas tão próximas e que nos arrastam.

Debord, um cineasta e filósofo definitivo para o nosso tempo. Seu trabalho foi deslocar o sentido antropológico a que o ser humano se deixou levar pelo espetáculo, tornando a realidade uma coisa frágil, comum, sem poder e da qual podemos fazer parte e ser iguais; o que ele nega numa confirmação histórica e dialética, de que o espetáculo reduz tudo à insignificância, enquanto a dominação pelos meios e as imagens se estrutura e extrapola, estrangulando nossa existência.

Debord utiliza o cinema como uma significação da arte para transformar a complexidade de uma totalidade em entendimentos. O que a realidade não faz e nem permite. Para que cheguemos ao entendimento de nossa individualidade, Debord decompõe o sentido do espetáculo em que a sociedade se transformou. O cinema então passa a recuperar a importância que o espetáculo lhe tirou, recuperando sua função social, enquanto os seres humanos são transformados em coisas e objetos. Os filmes de Debord são a síntese do materialismo histórico, de uma dialética aplicada à realidade. Para sua transformação além de uma situação. Um recurso de conhecimento avançado que Godard utiliza em seu moderno cinema, fazendo de cada espectador um ser social. E de cada realidade um lugar onde ele se forma.

11/2/2011

Fonte: ViaPolítica/Os autores

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