Cinema: uma complexa máquina internacional da indústria. Para nós leigos, cinema é apenas uma máquina de contar estórias.Na primeira exibição pública em 1895, Bernadet nos conta que Méliès, um mágico, queria comprar o cinematógrafo de Lumiére, o inventor da máquina cinematográfica, no qual foi desmotivado pelo próprio inventor, que não acreditava no potencial que inventara.A câmera captava as imagens em preto e branco e ainda não tinha som. Mesmo assim, aquilo que o público vira era quase que inacreditável.A câmera ficava fixa, gravando tudo o que acontecia na frente, como um espectador no teatro. O público se emocionava com o que via, como tudo o que eles viam na vida real, estavam vendo bem ali, numa tela, fora da realidade. O poder de ilusão já era tão grande que, mesmo sabendo que não era vida real, eram imagens dentro de uma tela, assustaram-se com o trem que vinha em suas direções, como se o trem fosse transbordar da tela para a realidade e atropelar todos na platéia.Até hoje é assim, talvez com mais intensidade ainda, pois choramos, sentimos medo, rimos quando estamos diante de um filme do qual nos identificamos. O cinema dominante sempre trabalhou, pra tudo que fosse passado na tela, chegasse tão próximo da realidade, a ponto de realmente acreditarmos "ser real".O cinema é feito a partir do ponto de vista de alguém e jamais poderá expressar-se sozinho sem a interferência do homem. É muito simplista dizer que o cinema retrata a realidade, transferindo para o filme a responsabilidade da história que está sendo contada.O fato de se poder fazer cópias, aumentou ainda mais possibilidade de dominação ideológica burguesa. Talvez isto explica as legislações de proteção ao cinema nacional, no entanto, são tantas as falhas, que o cinema dominante norte americano consegue burlar as leis, associando-se a produtoras locais ou produzindo nos próprios países, ou seja, "lei pra estrangeiro ver".Aqui no Brasil os cinemas são obrigados a exibirem filmes nacionais numa determinada quantidade de dias, o que não funciona muito se formos prestar atenção ou esta quantidade exigida é insuficiente diante da quantidade de importados que consumimos. As O Brasil ainda sofre sérias ameaças às restrições de importação e ainda correm o sério risco de comprometerem a balança comercial do país.O filme é um produto. Uma mercadoria abstrata que se compara a uma passagem de avião. Compramos um bilhete pra embarcar numa viagem pra logo em seguida passarmos o acento pra outro.O que circula entre o produtor, distribuidor e exibidor são sempre diretos e nunca uma mercadoria concreta. Direitos de distribuir e direitos de exibir.Linguagem Ideológica.Quando o filme deixou de ser uma reportagem cinematográfica, documentários, paisagens, meras vistas naturais, o cinema passou a ter uma linguagem própria, passara a ser visto como "arte". O americano Griffith foi o primeiro a montar as imagens com a intenção de contar uma história. História contada a partir do ponto de vista burguês, pois "O Nascimento de uma Nação" ou "Intolerância" foram considerados racistas pôr algumas personalidades que criticaram o filme na época.Agora, o cinema ficaria ainda mais próximo da realidade, mais do que nunca, quando o som se industrializou em 1928. A partir daí podiam captar ruídos que forçariam ainda mais a ilusão de verdade.Nos anos 20 o cinema dominante tornara-se narrativo e perigoso.Na União Soviética, Einseinstein também desenvolve uma decupagem narrativa, porém, sua teria não é representar a realidade, mas uma realidade cinematográfica. O som era válido desde que ficasse em contraste com as imagens, o que era totalmente oposto ao cinema americano, que sincronizava os sons de acordo com as imagens.Outros movimentos surgiram nos anos 20 e 30, como o expressionismo alemão que, influenciados pela literatura e as artes plásticas, contavam histórias fantasiosas.A vanguarda francesa, nos anos 20, não escolheu a narrativa. A narrativa era um aspecto da literatura e o cinema tinha que encontrar uma forma mais pura de expressão.O surrealismo estava longe de enredos e estórias, sua marca era demonstrar uma aversão total à burguesia.Todas estas formas de expressão tinham apenas um ponto em comum: se opunham ao sistema cinematográfico capitalista.Muitos diretores tiveram problemas com seus produtores que queriam interferir na montagem final do filme, obviamente, pensando no retorno financeiro.Por isso são tão importantes os circuitos alternativos de exibição, pois não fazem parte do sistema mercadológico.O Superego.Nos anos 30 e 40, o cinema industrial americano tinha o diretor como um empregado entre muitos, que servia apenas pra dirigir os atores e supervisionar o plano de trabalho. Nem o roteiro e nem a montagem ficavam sobre a sua responsabilidade. Acabavam as filmagens e partiam pra outro trabalho que fossem escalados.Nos anos 50 a Nouvelle Vague francesa trabalhou duramente contra o anonimato, surgindo assim, o "filme de autor", no qual o autor era aquele que tinha total responsabilidade e poder sobre o filme. Os diretores tomaram pra si o trabalho como criação exclusiva, como se o cinema não fosse um trabalho coletivo.Os roteiristas, sentindo-se menosprezados, queriam tomar a atenção e lutaram pela valorização da escrita cinematográfica. Afinal, o filme seria feito para ilustrar o roteiro e não, vice e versa. Então começara um esvaziamento da imagem em favor da palavra.O que ainda não entendiam é que o cinema são fragmentos que formam um todo, que todas as funções são tão importantes quanto o narcisismo de um.Talvez a linguagem secreta do cinema seja fugir de todos estes esteriótipos. Seja a fuga da realidade. Seja a fuga do estrelismo. Seja abrir mão do egocentrismo em favor da arte.Buñuel comparou o filme ao sonhos, os de quando estamos dormindo. Não ao sonho que os americanos vendem de um ideal de vida burguesa. O artista vira uma estrela da mídia e o seu trabalho, tanto faz.O elogio ao tédio a necessidade que ele tinha de incomodar, uma rebeldia que não queria conciliar com o sistema dominante, tanto que não sentia-se satisfeito com boas críticas aos seus filmes.Buñuel queria ser anônimo, o que foi impossível, a ponto de defender a exclusão dos créditos no filme. Esta sim seria a verdadeira linguagem secreta do cinema.
Priscilla Duarte
quarta-feira, 6 de agosto de 2008
comentários sobre cinema
"A magia do cinema..." Quem primeiro a reconheceu foi Mélies, que apesar de experiente em truques, como mágico, nunca havia visto um tão perfeito. Imitação perfeita da natureza, ou será a própria realidade?A vontade de reproduzir a realidade não é novidade, a história da pintura mostra os avanços a caminho desse objetivo, com o uso da perspectiva, por exemplo. Indo além da pintura, seguindo a história, a fotografia surge ameaçando a representação naturalista, que não teria mais porque com a câmera fotográfica. Perguntaram-se: "será o fim da pintura?" Obviamente não foi, assim como a TV não tirou a "magia" do cinema.O "cinematógrapho" era usado no início somente a serviço da ciência. O francês Marey, criador do "fuzil fotográfico", capaz de tirar 12 fotos/segundo, demonstrava o seu desprezo pelo cinema espetáculo, para ele não havia sentido projetar o que se vê melhor com os próprios olhos. Na verdade, essa crítica de Marey não deixa de ser coerente, já que na mesma época, final do XIX, esse era o discurso contra o estilo já esgotado que vinha dominando as artes desde o início do renascimento, o naturalismo. Percorrendo o mesmo caminho, mas em tempos diferentes, o cinema, assim como os fazeres artísticos mais antigos, pintura e escultura, também buscou comprovar a sua pureza. Se pintores e escultores precisaram lutar pelo o reconhecimento de suas artes, no cinema não foi diferente, sendo visto como tal depois do aperfeiçoamento do seu processo de montagem. Os efeitos usados nessa etapa puderam mostrar que o cinema não se destinaria apenas a mera cópia, mas manipulação de uma realidade por um autor, que como qualquer artista, expressa sua interpretação e é capaz de recortar o espaço a sua maneira. Mais tarde, com o expressionismo alemão, essa subjetividade do cinema é escancarada.A arte cinematográfica, ou seja, a arte da montagem, se desenvolveu muito no cinema de Eisenstein. Sem o velho objetivo de reprodução do real, ele construía uma nova realidade. Ele desenvolvia um raciocínio para o entendimento da história, um pensamento dialético para dar sentido às suas imagens. A música, apesar de ter sido acrescentada aos seus filmes posteriormente, ela possui um papel importante, pois reforça as emoções das imagens mudas já bem expressivas.Eisenstein não se aproveitou do valor de troca atribuído ao cinema pelo "star- system", o estrelato, pois seus personagens não seguiam trajetórias individuais. Em seus filmes que retratam a situação da URSS onde vivia, uma classe inteira era protagonista, a classe dos trabalhadores, ou mesmo a própria Revolução de 1917, em Outubro, assumia esse papel. Eram personagens coletivos. Inclusive, em tais filmes, é irônico como o cinema, "a arte da burguesia", essa que o incentivou como meio de propagação de suas idéias, costumes, facilitando a dominação cultural, ideológica e estética, é usado menosprezando esta classe, e a favor daqueles menosprezados por ela.Dedicando- se ao cinema brasileiro, pode-se observar hoje o seu crescimento e maior desenvolvimento, por mais tardio que pareça. Existe sim há muito tempo uma produção brasileira, porém dificultada pela "febre norte- americana". Além de possuir mais recursos, essas grandes cinematografias dominam os gostos, e por ser de mais fácil acesso, acostuma os espectadores a ritmos e formatos específicos. Aqui se trata também de política, pois países subdesenvolvidos são obrigados a abrir seus portos àqueles de quem depende financeiramente. Por essas coisas que o Brasil acabou por educar espectadores principalmente para o cinema legendado, pouco treinados auditivamente e visualmente. Filmes nacionais sempre parecem ter o som péssimo! A desvantagem brasileira para países como Japão, por exemplo, que também tem sua produção cinematográfica, é não ser forte culturalmente, no sentido de aceitar os importados, entendê-los e considerá-los de maior qualidade. Apesar de, o fato de aceitá-los, não considero uma desvantagem em si, o que nos falta é degustá-los antropofagicamente, como já sugerira Oswald de Andrade.
Geysa G. R. de Souza
Geysa G. R. de Souza
imagem
Tudo à nossa vista é imagem
A imagem é virtual, o qual, tudo aquilo que vemos, é outra coisa além do próprio objeto. Existe o objeto e o que se vê do objeto. Até nós mesmos somos imagem, essência cristalina do reflexo e o que se vê é o que já passou. O tempo fica entre o instante e o passado, atual é o que é real, o presente. O corpo é o limite que vive a experiência do real.
A imagem virtual é aquela que se tem na memória, que se duplica. Se apenas o fato de abrir o olho e tudo que se passa na frente é imagem, então tudo é simulacro pra Deleuze e também para Bergson. Apenas o corpo vive o real e o atual, o corpo que vive esse menor intervalo do tempo existente, o presente. O corpo é o limite.
"O nosso corpo (que é o fenômeno pra si mesmo) tem um elo com a consciência que se apropria do corpo, eles nunca se separam". (Merleau Ponty)
O ator seria aquele que tem a experiência da imagem virtual e atual, como uma imagem no espelho, duplicação. O ator tem a sua imagem atual porque veste diversos personagens.
Afirmar o simulacro é uma maneira de aceitar a multiplicidade falsificante do mundo. Não há lugar onde a imagem não descreva nosso próprio universo.
Em "As Potências do Falso", Deleuze opõe dois pontos que regem a imagem, o "orgânico" e o "cristalino" ou "regime cinético" e "regime crônico".
A imagem-movimento é orgânica e a imagem-tempo, cristalino. O plano-sequência é a menor manipulação do tempo a favor do real, do orgânico.
Orgânico é o sistema lógico que predomina. Princípio, meio e fim. Menos descolada da realidade. No cristalino o movimento é gerado através do tempo. O real e o imaginário não se distinguem.
No cristalino o impacto é ótico e sonoro, livre de concatenação lógica e tempo cronológico, há uma autonomia do tempo em relação ao movimento.
No orgânico o real suposto contém continuidade, a narração pretende ser verídica e verossímel, há um privilégio do movimento em detrimento do tempo. O objeto sempre é a realidade e a vida, nexo-causal. Servem pra definir situações sensório-motoras.
Para Deleuze, a montagem è principio fundamental no cinema, assim como Stanley Kubrick declarou uma vez: "o cinema é o maior ladrão, o cinema é montagem/edição". Kubrick diz que o cinema roubou tudo das outras artes e fez montagem. Esta tese sobre a montagem Bazin contestou depois para falar do cinema moderno, principalmente de Orson Wells que fez filmes com longos planos-sequênia.
"A Palavra e Imagem" de Sergei Eisenstein, também, diz sobre a importância da montagem num período do cinema soviético, onde a necessidade da exposição coerente e orgânica do tema, do material, da trama, da ação, do movimento interno da seqüência do filme e de sua ação dramática como um todo, além do aspecto emocional da história, de sua lógica de continuidade, o ato de narrar uma história coesa. A montagem é uma poderosa ajuda nesta tarefa de transpassar uma falsa realidade pra comover o público.
Todo esse falseamento da imagem pertence ao cinema, um falseamento da realidade que continua a tratar da realidade, porém, quanto mais desconecta com a realidade, mais potente esta arte pode ser.
Hans Belting em seu texto, "Por uma antropologia da imagem", no qual ele propõe a análise da questão "o que é a imagem?", separa o que ele chama de meio físico de imagem mental.
Relaciona com a morte, a condição da imagem como presença de uma ausência, assim como Roland Barthers descreve no livro "Câmera Clara". Felippe Dubois no oitavo capítulo do livro "O ato fotográfico", também se refere à obra de Denis Roche como presença de uma ausência, experiência do precipício interior, paradoxo da agitação louca e da vertigem, que é a vontade de viver e o medo de sofrer.
Voltando ao Belting: Antropologia da imagem como um substituto da história tradicional, pois a história da arte não vai dialogar a penas com as histórias, e sim, também, com outras disciplinas, como a antropologia.
Como uma relação de especificidade da cultura, recortes e diferenças. A sociedade da imagem vai rever o conceito de arte e levar em consideração a imagem, pois a fotografia nos trouxe uma visão mais fragmentada de mundo. Portanto, Belting vai além do âmbito artístico pra analisar esta questão, "o que é imagem?".
Quando Belting cita, imagem virtual e meio físico, tem muito haver com o que Deleuze fala de imagem real, atual e virtual. Belting acredita numa abordagem antropológica da imagem. Não se trata de etnologia, Belting segue uma definição européia e não fala exclusivamente de "arte", o debate da arte com a antropologia não se aplica ao discurso da arte ocidental. Belting bebe na cultura grega pra falar da imagem e distinguindo a aparência e o ser (imagem virtual e imagem atual). Fala do eidolon e kolossos no pensamento pré-clássico.
Eidolon como a imagem de um sonho, aparição de um deus ou ancestrais mortos, o que abrange a idéia de imagem mental (virtual). O kolossos representa um artefato de metal ou pedra, no qual, as imagens se materializam (real). Depois surgiu o termo eikon juntamente com o termo mimesis. Eikon desvalorizou o eidolon porque adotou o sentido de cópia ou imitação.
Ele afirma a imagem como presença de uma ausência ao lembrar-nos sobre as imagens em funerais, no qual a imagem substitui o lugar do corpo morto. A presença da foto do morto anuncia a própria ausência, a morte. Roland Barthes também lembra das famílias que tiravam fotografias em inseriam uma fotografia de um membro que já tinha morrido pra compor a foto, como aquelas máscaras que faziam dos mortos para alguém representa-los colocando-as para aparecer numa fotografia.
Não há nada mais sublime do que representar um morto com uma foto, no qual, foi congelada uma imagem do mesmo em um momento em que esteve vivo. A condição do homem, morrer, mas a fotografia pode congelar um instante do tempo e, possivelmente, eternizar esta imagem da pessoa, já morta, quando viva. Como disse Roland Barthes, Isso foi! Roland Barthes quando se viu numa fotografia disse: "tornei-me todo-imagem, i. e. morte em pessoa", essa obsessão pelo duplo seria a experiência de uma morte. Aqui não podemos deixar de lembrar Walter Benjamim quando fala da áurea em "A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica".
Jean François Lyotard em, "O instante, Newman", falou do sublime na obra de Barnett Newman, um artista também interessado em arte "primitiva", no qual conta um relato do artista quando esteve diante de túmulos de índios miami, os miamisburg.
Barnett Newman fala que quando esteve diante destes túmulos teve um estalo, como um momento de epifania. Foi então que pensou em produzir arte para o homem. Por isso que Lyotard fala que a obra de Newman não tem uma relação triádica, como a mensagem do artista através da obra para o espectador. È uma relação apenas entre a obra e o observador. O quadro é o mensageiro e a mensagem, não há nada para se interpretar, adivinhar ou desvendar. É o instante, o presente. O sentimento sublime é a consciência da condição humana, estar presente é estar vivo em caminho pra morte.
Belting fala do tempo e do espaço no sentido de que a imagem sempre persistirá por que nunca saberemos como a morte é. Relaciona máscaras com imagens, um corpo que veste esta máscara se transforma em entidade, imagem virtual, como o ator na explicação de Deleuze.
Foi através do novo conceito de sublime por de Kant e Burque, que a modernidade se enveredou por um caminho de experimentações e possibilidades artísticas infinitas, pois através do novo conceito de belo, puderam sair da condição de figuração da obra de arte e o mundo da fotografia embarcou nessa. Deu origem a crise dos discursos totalizantes. Não é mais uma questão de estética/belo, é uma questão da filosofia da arte. O que vale é a discussão em torno do que é arte.
"Arqueologia do Saber" de Foucault fala da diferença entre visão totalitária da história até os anos 50 e da visão fragmentada a partir dos anos 60. Os discursos lineares tendem a dar continuidade, a história era, até então, um discurso ocidental homogênio, não leva em conta as diferenças de outros lugares, como a Ásia, África, Oceania, etc.
Nos aos 60 as vanguardas acontecem em vários lugares ao mesmo tempo, um discurso linear e totalitário não dá conta da fragmentação das características deste tempo de descobertas. Para o discurso se uniformizar, tem de deixar de fora tudo que não cabe na continuidade histórica. Não há como unificar tudo, uma coisa independe da outra, não há uma linha coerente da história.
Aí que entra a questão do cinema moderno em contrapartida com o cinema clássico. O cinema moderno não se pretende mais tão orgânico, no qual, pretendia-se contar uma história coerente com início, meio e fim.
Houve um esgotamento dos clichês e das fórmulas prontas, nos quais, o cinema havia mergulhado, principalmente quando se trata do cinema norte-americano.
O filme clássico pretendia-se a imagem semelhança do real, como que um monte de mentiras pra tentar dizer uma "verdade".
A montagem agora não é tão fundamental quanto foi no cinema clássico. Também não foi completamente descartada, ela passara a ser um complemento ao invés de ser fundamental.
Nos anos 30 os vários gêneros americanos e o realismo noir da França tinham o mesmo tipo de decupagem. Tudo pra chegar ao mais próximo da realidade. A história era descrita por uma sucessão de planos que tornava mais eficaz a maneira de apresentar a realidade.
A decupagem da técnica do campo/contra-campo foi "substituída", de alguma maneira, pelo plano-sequêcia, a fim de questionar esta tal "realidade", da qual a técnica manipulava ao máximo as imagens através da edição, pra contar uma história.
Priscilla Duarte
A imagem é virtual, o qual, tudo aquilo que vemos, é outra coisa além do próprio objeto. Existe o objeto e o que se vê do objeto. Até nós mesmos somos imagem, essência cristalina do reflexo e o que se vê é o que já passou. O tempo fica entre o instante e o passado, atual é o que é real, o presente. O corpo é o limite que vive a experiência do real.
A imagem virtual é aquela que se tem na memória, que se duplica. Se apenas o fato de abrir o olho e tudo que se passa na frente é imagem, então tudo é simulacro pra Deleuze e também para Bergson. Apenas o corpo vive o real e o atual, o corpo que vive esse menor intervalo do tempo existente, o presente. O corpo é o limite.
"O nosso corpo (que é o fenômeno pra si mesmo) tem um elo com a consciência que se apropria do corpo, eles nunca se separam". (Merleau Ponty)
O ator seria aquele que tem a experiência da imagem virtual e atual, como uma imagem no espelho, duplicação. O ator tem a sua imagem atual porque veste diversos personagens.
Afirmar o simulacro é uma maneira de aceitar a multiplicidade falsificante do mundo. Não há lugar onde a imagem não descreva nosso próprio universo.
Em "As Potências do Falso", Deleuze opõe dois pontos que regem a imagem, o "orgânico" e o "cristalino" ou "regime cinético" e "regime crônico".
A imagem-movimento é orgânica e a imagem-tempo, cristalino. O plano-sequência é a menor manipulação do tempo a favor do real, do orgânico.
Orgânico é o sistema lógico que predomina. Princípio, meio e fim. Menos descolada da realidade. No cristalino o movimento é gerado através do tempo. O real e o imaginário não se distinguem.
No cristalino o impacto é ótico e sonoro, livre de concatenação lógica e tempo cronológico, há uma autonomia do tempo em relação ao movimento.
No orgânico o real suposto contém continuidade, a narração pretende ser verídica e verossímel, há um privilégio do movimento em detrimento do tempo. O objeto sempre é a realidade e a vida, nexo-causal. Servem pra definir situações sensório-motoras.
Para Deleuze, a montagem è principio fundamental no cinema, assim como Stanley Kubrick declarou uma vez: "o cinema é o maior ladrão, o cinema é montagem/edição". Kubrick diz que o cinema roubou tudo das outras artes e fez montagem. Esta tese sobre a montagem Bazin contestou depois para falar do cinema moderno, principalmente de Orson Wells que fez filmes com longos planos-sequênia.
"A Palavra e Imagem" de Sergei Eisenstein, também, diz sobre a importância da montagem num período do cinema soviético, onde a necessidade da exposição coerente e orgânica do tema, do material, da trama, da ação, do movimento interno da seqüência do filme e de sua ação dramática como um todo, além do aspecto emocional da história, de sua lógica de continuidade, o ato de narrar uma história coesa. A montagem é uma poderosa ajuda nesta tarefa de transpassar uma falsa realidade pra comover o público.
Todo esse falseamento da imagem pertence ao cinema, um falseamento da realidade que continua a tratar da realidade, porém, quanto mais desconecta com a realidade, mais potente esta arte pode ser.
Hans Belting em seu texto, "Por uma antropologia da imagem", no qual ele propõe a análise da questão "o que é a imagem?", separa o que ele chama de meio físico de imagem mental.
Relaciona com a morte, a condição da imagem como presença de uma ausência, assim como Roland Barthers descreve no livro "Câmera Clara". Felippe Dubois no oitavo capítulo do livro "O ato fotográfico", também se refere à obra de Denis Roche como presença de uma ausência, experiência do precipício interior, paradoxo da agitação louca e da vertigem, que é a vontade de viver e o medo de sofrer.
Voltando ao Belting: Antropologia da imagem como um substituto da história tradicional, pois a história da arte não vai dialogar a penas com as histórias, e sim, também, com outras disciplinas, como a antropologia.
Como uma relação de especificidade da cultura, recortes e diferenças. A sociedade da imagem vai rever o conceito de arte e levar em consideração a imagem, pois a fotografia nos trouxe uma visão mais fragmentada de mundo. Portanto, Belting vai além do âmbito artístico pra analisar esta questão, "o que é imagem?".
Quando Belting cita, imagem virtual e meio físico, tem muito haver com o que Deleuze fala de imagem real, atual e virtual. Belting acredita numa abordagem antropológica da imagem. Não se trata de etnologia, Belting segue uma definição européia e não fala exclusivamente de "arte", o debate da arte com a antropologia não se aplica ao discurso da arte ocidental. Belting bebe na cultura grega pra falar da imagem e distinguindo a aparência e o ser (imagem virtual e imagem atual). Fala do eidolon e kolossos no pensamento pré-clássico.
Eidolon como a imagem de um sonho, aparição de um deus ou ancestrais mortos, o que abrange a idéia de imagem mental (virtual). O kolossos representa um artefato de metal ou pedra, no qual, as imagens se materializam (real). Depois surgiu o termo eikon juntamente com o termo mimesis. Eikon desvalorizou o eidolon porque adotou o sentido de cópia ou imitação.
Ele afirma a imagem como presença de uma ausência ao lembrar-nos sobre as imagens em funerais, no qual a imagem substitui o lugar do corpo morto. A presença da foto do morto anuncia a própria ausência, a morte. Roland Barthes também lembra das famílias que tiravam fotografias em inseriam uma fotografia de um membro que já tinha morrido pra compor a foto, como aquelas máscaras que faziam dos mortos para alguém representa-los colocando-as para aparecer numa fotografia.
Não há nada mais sublime do que representar um morto com uma foto, no qual, foi congelada uma imagem do mesmo em um momento em que esteve vivo. A condição do homem, morrer, mas a fotografia pode congelar um instante do tempo e, possivelmente, eternizar esta imagem da pessoa, já morta, quando viva. Como disse Roland Barthes, Isso foi! Roland Barthes quando se viu numa fotografia disse: "tornei-me todo-imagem, i. e. morte em pessoa", essa obsessão pelo duplo seria a experiência de uma morte. Aqui não podemos deixar de lembrar Walter Benjamim quando fala da áurea em "A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica".
Jean François Lyotard em, "O instante, Newman", falou do sublime na obra de Barnett Newman, um artista também interessado em arte "primitiva", no qual conta um relato do artista quando esteve diante de túmulos de índios miami, os miamisburg.
Barnett Newman fala que quando esteve diante destes túmulos teve um estalo, como um momento de epifania. Foi então que pensou em produzir arte para o homem. Por isso que Lyotard fala que a obra de Newman não tem uma relação triádica, como a mensagem do artista através da obra para o espectador. È uma relação apenas entre a obra e o observador. O quadro é o mensageiro e a mensagem, não há nada para se interpretar, adivinhar ou desvendar. É o instante, o presente. O sentimento sublime é a consciência da condição humana, estar presente é estar vivo em caminho pra morte.
Belting fala do tempo e do espaço no sentido de que a imagem sempre persistirá por que nunca saberemos como a morte é. Relaciona máscaras com imagens, um corpo que veste esta máscara se transforma em entidade, imagem virtual, como o ator na explicação de Deleuze.
Foi através do novo conceito de sublime por de Kant e Burque, que a modernidade se enveredou por um caminho de experimentações e possibilidades artísticas infinitas, pois através do novo conceito de belo, puderam sair da condição de figuração da obra de arte e o mundo da fotografia embarcou nessa. Deu origem a crise dos discursos totalizantes. Não é mais uma questão de estética/belo, é uma questão da filosofia da arte. O que vale é a discussão em torno do que é arte.
"Arqueologia do Saber" de Foucault fala da diferença entre visão totalitária da história até os anos 50 e da visão fragmentada a partir dos anos 60. Os discursos lineares tendem a dar continuidade, a história era, até então, um discurso ocidental homogênio, não leva em conta as diferenças de outros lugares, como a Ásia, África, Oceania, etc.
Nos aos 60 as vanguardas acontecem em vários lugares ao mesmo tempo, um discurso linear e totalitário não dá conta da fragmentação das características deste tempo de descobertas. Para o discurso se uniformizar, tem de deixar de fora tudo que não cabe na continuidade histórica. Não há como unificar tudo, uma coisa independe da outra, não há uma linha coerente da história.
Aí que entra a questão do cinema moderno em contrapartida com o cinema clássico. O cinema moderno não se pretende mais tão orgânico, no qual, pretendia-se contar uma história coerente com início, meio e fim.
Houve um esgotamento dos clichês e das fórmulas prontas, nos quais, o cinema havia mergulhado, principalmente quando se trata do cinema norte-americano.
O filme clássico pretendia-se a imagem semelhança do real, como que um monte de mentiras pra tentar dizer uma "verdade".
A montagem agora não é tão fundamental quanto foi no cinema clássico. Também não foi completamente descartada, ela passara a ser um complemento ao invés de ser fundamental.
Nos anos 30 os vários gêneros americanos e o realismo noir da França tinham o mesmo tipo de decupagem. Tudo pra chegar ao mais próximo da realidade. A história era descrita por uma sucessão de planos que tornava mais eficaz a maneira de apresentar a realidade.
A decupagem da técnica do campo/contra-campo foi "substituída", de alguma maneira, pelo plano-sequêcia, a fim de questionar esta tal "realidade", da qual a técnica manipulava ao máximo as imagens através da edição, pra contar uma história.
Priscilla Duarte
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